Os teus olhos são tristes, disseram-me um dia. Ah! Como a minha mente cognitiva desejou rejeitar essa acusação. Colocá-la no lixo da memória, onde milhares de conversas vagueiam perdidas para sempre. Eu só conhecia as minhas rugas de alegria, os rasgos radiantes na pele em torno dos meus olhos, e por mim estava bem assim.
Volvidos mais de quatro anos, lembro-me perfeitamente desse momento em que a tristeza dos meus olhos foi declarada. Foi como se dentro de mim houvesse uma máquina de Rube Goldberg, cheia de partes estranhas e sem nexo, que entrou em movimento. Aos poucos fui descobrindo o peso nas pálpebras, a pressão lacrimal e o aperto no coração. Afinal existiam sucalcos de lágrimas não derramadas. Afinal também havia tristeza acumulada.
“Nós não nos conhecemos realmente a nós próprios a não ser que consigamos sentir e interpretar as nossas sensações físicas; nós precisamos de registar e agir sobre essas sensações para navegar em segurança na vida.”,
Bessel van der Kolk – The Body Keeps the Score
As sensações físicas… até há pouco tempo limitavam-se a dores, de burro, de cabeça, de barriga. O meu corpo era uma criança a clamar pela atenção de uma mente sentada numa poltrona, entretida com um jornal sobre o passado e o futuro. Foi preciso uma birra do meu corpo para que se iniciasse um novo diálogo e alguém me pudesse dizer:
Os teus olhos são tristes.
Assim começou a nascer uma nova sensibilidade para com as sensações e variações no interior do meu corpo. Comecei a cultivar a minha interoceção. Incluir na mente as sensações e as emoções é como reencontrar família há muito desaparecida. Há uma estranheza e uma incredulidade, de como se não fosse nada, mas que é tanto.
Hoje perguntaram-me: Como estás?
Sinto um peso nas pálpebras. A minha respiração está lenta. O meu corpo está pesado. Estou mais virado para dentro do que para fora. Há alguma tristeza, mas isso é ok.
E tu, como estás?
Gostei. A tristeza não é má, chorar faz bem, lava a alma, liberta. O problema da tristeza é quando se instala e não nos deixa olhar com outros olhos. Aí há que chorar o que há para chorar, combater, procurar ajuda, ….e depois arrumá-la um bocadinho mais para trás e trazer as novas lentes que nos permitem ver que, afinal a tristeza não é má se, como em tudo na vida, vier em doses certas.
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Obrigado Célia. A tristeza não é mesmo má. E para sabermos a dose certa é preciso olhar para ela. Abraço
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Gostei, mas soube a pouco, habituaste-nos a uma reflexão mais extensa e profunda. No teu olhar atual não vislumbro tristeza, mas sim uma curiosidade muito grande pelo que te rodeia, em que prescrutas todos e tudo à tua volta.
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Continuarão a haver reflexões mais extensas. Esta é uma experiência. Obrigado pelo teu olhar.
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Achei profundo. Diz-se que os olhos são o espelho da alma, por vezes espelham de forma acertada, outras não. A vida também é tristeza… e ainda bem, para olharmos de dentro para fora, pormos no lugar do outro, agradecermos o que temos e levantarmo-nos uma vez mais, fortes e confiantes… Tal como numa receita são necessários diversos ingredientes para obtermos um prato, assim também deverá ser a nossa existência, temperada por diversos sentimentos. 🙂
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Isso, queremos todos os sabores da vida!
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Também tens olhos curiosos! E olhos meigos!
Também gostei da versão curta. Prefiro ler aqui no blog, porque eu gosto muito de ver as fotografias 🙂
Abraço!!
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Olhos meigos … Gosto. Obrigado.
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Meu caro Rodrigo.
A este, “E tu, como estás?”, tenho de começar por dizer que ontem fiquei sem esquentador enquanto me preparava para lavar a louça do jantar (pouca, fazendo como habitual neste caso, não usar a máquina). Logo cedo 07h30 fui comprar pilhas, mas não resolvi. O banho foi de água fria o que não fazia há muitos anos, mas gostei, estou ótimo, sinto-me mais novo não conhecia tal sensação agradável, vou repetir. Pelas 09h00 telefonei para a “Casa Maia” e o técnico vem observar entre as 15h00 e as 15h30. Entretanto, às 13h00, estou na A25A para participar no “AAANIMADOS – 06 de março de 2018”, almoço com o convidado Padre, Professor Doutor (Universidade de Coimbra), Anselmo Borges.
Agora, 22h30, termino esta conversa.
Caríssimo Rodrigo do teu texto relevo,
“Assim começou a nascer uma nova sensibilidade para com as sensações e variações no interior do meu corpo. Comecei a cultivar a minha interoceção. Incluir na mente as sensações e as emoções é como reencontrar família há muito desaparecida. Há uma estranheza e uma incredulidade, de como se não fosse nada, mas que é tanto.”,
para te dizer que é muito importante a interação com os outros no mundo profissional da atualidade da nossa sociedade. Apesar dos meus 82 anos a completar este mês continuo envolvido em “Estratégias de Comunicação para conseguir envelhecimento com Qualidade de Vida”, daqui ser forçado a esquecer não só os meus problemas corporais de sofrimento interno como os que me chegam dos ainda vários mundos sociais onde continuo envolvido.
Este meu continuar a sentir-me bem, mesmo na posição de “cuidador informal em tempo integral” da minha mulher no modelo de cuidados e apoios a pessoas de mais idade se realizar em ambiente familiar, tem a ver com envolvimento em atividades diversificadas e na atitude face a provocações de “amigos” que enfrento desportivamente a partir de me assumir social e politicamente como “democrata socializante, praticante, influenciado pela religião católica (leitor aqui na paróquia)”, valores e éticas que substanciam tratar bem quem me trata mal.
Portanto meu caro Rodrigo, Estou bem por fora e por dentro, o que se pode observar nos meus olhos.
Um abraço da maior consideração e sincera amizade.
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Caro António. Tu não paras!
Espero chegar à tua idade com metade da tua vitalidade.
Um grnade abraço.
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O teu texto ora mais curto não é por isso menos intenso. Sabem mais os outros de nós do q nós próprios. Por vezes não sei pq estou triste. E triste estou mts vezes. Apesar do meu habitual bo m humor vou entristecendo com a vida. Não te respondi de pronto para q a resposta n saísse mais triste. Abraço te hoje com mais força.
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Obrigado Jorge pelas tuas palavras.
Um bom abraço para ti.
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